Slhueta de costas, mostrando longas pernas, calçando sapatos de salto, ao lado de uma placa onde se lê "Mar Doce Lar"

Completei 49 anos. E agora?

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Idade e transgeneridade/não binaridade

Parabéns! Não parece, Mar… Desculpe não ter escrito na sua timeline, mas sabe como é, sendo apenas uma representação e amálgama de leitores e seus amigos, fica difícil interagir, já que não posso ter perfil próprio. 🤣”

Ué? Sou eu quem chegou ao final da quarta década e você é quem ficou em crise? Sai desse complexo de Deadpool e vamos em frente…

Mas é isso. Quarenta e nove. Há coisas a serem ditas sobre isso.

Primeiro, é sempre bom lembrar o privilégio que tenho por ter ultrapassado a expectativa de vida de pessoas trans e travestis, que é de 35 anos. Navego no mundo sem que me enquadrem, na maior parte do tempo, como pessoa trans. Ruim para mim, emocionalmente, porque me reconhecem de uma forma muito incômoda, mas é um privilégio no sentido de sobrevida e integridade física.

Fisicamente, como disse o padawan, estou bem — um pouco fora do peso — com saúde muito boa no geral (sinusite alérgica crônica e uma uveíte são as exceções), e dizem algumas pessoas que além de bem de saúde, estou com muita “saúde”…

Hummm, recebendo elogios, Mar?

Sempre bom, não é? Elas falam, eu acredito…

Pessoalmente, estou bem comigo, como nunca estive. E pretendo continuar olhando para mim, me conhecendo, me cuidando e vivendo minha lenda pessoal. Mas essa é minha história.

Independente de estarmos bem conosco ou não, o envelhecimento traz preocupações, principalmente se somos mulheres e mais ainda, LGBT+

Nossa sociedade demanda que mulheres sejam cuidadoras dos homens. Essa mesma sociedade não resolveu — e não quer resolver — a questão das pessoas de mais idade. Essa composição de fatores é grave. Afinal, se as mulheres cuidam dos homens, quem cuidará das mulheres, conforme envelhecemos?

Quando a mulher é não hetero, trans (ou pessoa transfeminina), e homens trans e pessoas transmasculinas que não são mulheres, mas assim são (des)entendidas pela sociedade, que papel lhe será reservado?

Depois de 49 anos, minhas perenes questões de identidade de gênero, que vem da infância, estão bem assentadas. Meus passos, minhas vivências, definidas — embora me seja importante poder me reinventar.
Mas me preocupo com esse futuro, o envelhecimento. Tenho outro privilégio, de ter pessoas que se puderem, estarão lá por mim, conforme envelheço e vier a necessitar. Mas, mais uma vez, essa é minha história.

Eu preciso olhar para essas pessoas — que tem outras histórias, sem meus privilégios. Até porque, a sociedade não tem um plano, e as pessoas têm suas vidas, logo, nada é certo sobre a fase final de nosso processo de envelhecimento.

Temos que pensar esse plano, cobrar do poder público e nos apoiar enquanto isso, e sempre.

Exatamente, padawan, exatamente… Mas falaremos mais sobre isso, ideias existem. Enquanto isso, sigamos, rumo ao primeiro meio século!

Primeiro, Mar?

A Tia ainda tem coisas pra explicar mais um tempinho… 😊

Pretendia que esse texto fosse mais leve, divertido, celebrando meu aniversário recente. Mas estou envolvida com reflexões acerca dessas questões de envelhecimento.

Minha vida mostrou claramente que saúde é precária, tudo muda muito rápido, mesmo para quem se cuida. E todas as pessoas envelhecem, sem que a sociedade esteja plenamente preparada para lidar com isso.

Cada vez mais me enquadro no recorte das mulheres não hetero (mesmo sendo pessoa não binária transfeminina) , que como dito acima, tem questões muito importantes e específicas na dita “melhor idade” e além…
Todos esses questionamentos acabaram se insinuando no texto.
E é importante que seja publicado assim.

Mas que fique claro, reforço o que postei em minhas redes sociais:
Este foi meu melhor aniversário em muito tempo, em termos emocionais!