Slhueta de costas, mostrando longas pernas, calçando sapatos de salto, ao lado de uma placa onde se lê "Mar Doce Lar"

De Lésbicas e invisibilidade

by

Sou lésbica. #prontofalei.

Sou lésbica. #prontofalei.

Essa condição é parte integrante e essencial de minha identidade não binária transfeminina.

-”Você já falou sobre isso, há algum tempo, Mar. Mas preferiu definir como sapatrans, não é isso?”

Sim, padawan, é isso mesmo. Mas no final das contas, usar de uma hashtag (a qual é uma brincadeira dentro de parte da comunidade trans) para descrever essa parcela de minha identidade não é justo comigo, nem claro para as pessoas. Eu poderia “importar” algum dos termos usados na internet anglófona, mas seria contraproducente. Ficamos no simples – e reconheço que há setores que terão palavras desabonadoras para mim, pela “ousadia” – e usemos um termo conhecido e que descreve de maneira acurada a que ordem pertencem meus afetos e desejos.

-”Acho justo!”

E não está só, padawan. Tenho tido bastante acolhimento: recebi – já há algum tempo – convite para integrar um coletivo de mulheres (trans e cis) que amam mulheres. Casualmente, em certos momentos, aconteceu de dizerem “nós, lésbicas”, me incluindo. Afora outras situações em que me incluem entre as “meninas”.

(Em tempo: esse último parágrafo tem marcações especificas que são referência e agradecimento à vocês que disseram essas frases, queridas)

-”Você vai falar sobre a luta das mulheres trans e pessoas não binárias que se reconhecem transfemininas, que amam mulheres para se integrarem aos movimentos de lésbicas e mulheres bissexuais?”

Não hoje… Embora seja tópico muito importante.

Quero lembrar hoje, neste Dia da Visibilidade Lésbica e da Mulher Bissexual, como aínda há muita invisibilidade

Somos, desde a I Conferência Nacional (então chamada GLBT), em junho de 2008, a primeira letra na sigla base do movimento, LGBT e nas propostas (LGBTI e similares), como decorrência inclusive das reivindicações das próprias lésbicas, para aumentar a visibilidade, chamando a atenção, inclusive, à opressão combinada por serem mulheres, e por terem seus afetos orientados à outras mulheres.

Entretanto, ainda há muito a ser trilhado para que realmente estejamos na luz. Ou melhor, sejamos reconhecidas, porque na luz, para ser alvo de apedrejamento, já estamos há muito tempo...

A sociedade em geral ainda percebe as mulheres (cis) que amam mulheres como “mal amadas” (ou mal comidas, mesmo), portanto desiludidas que se “acharem o homem certo”, voltam ao “normal”… Afora que os relacionamentos são vistos como "brincadeiras entre amigas" , não sérios. Como isso é considerado um estado transitório, não há suficiente interesse ou entendimento das necessidades de casais (ou outras composições não monogâmicas) de mulheres, seja no âmbito legal, de saúde, profissional, e também nas situações de envelhecimento.

Não podemos esquecer de uma característica muito específica – e hedionda – da lesbofobia, que é o estupro corretivo, que supostamente, recolocaria a mulher lésbica ou bi “no caminho certo”.

Um pensamento bizarro, machista ao extremo, crer que sexo com penetração por parte de um homem (cis) – mesmo violento e contra a vontade da mulher – é algo “tão sublime” que alteraria os afetos e desejos dela.

-”Triste verdade… Mas, Mar, e as mulheres trans e pessoas transfemininas? Acho que tem outros complicadores, não?”

Com certeza! Elas tem outras questões, típicas de pessoas trans que se somam. Transfobia. Por exemplo, a eterna associação que a norma cishetero trás e que leva ao questionamento perene do porque a pessoa “virou mulher, se é pra pegar mulher”, deslegitimando identidade e sexualidade de uma vez só. A própria materialização de nossos afetos é complicada de outras formas, por conta muitas vezes, da genitalização das pessoas e seus gêneros. E, claro, questões próprias de saúde.

Mas, ressalto: ser lésbica/bi trans ou não binária não é pior que o ser como mulher cis. É apenas diferente. Afinal, não há hierarquia de opressões, pois elas se interseccionam.

O que existem são urgências e momentos de luta.

E a luta… A luta continua.

Além de um agradecimento especial para minha amiga Vanini Lima, pela contribuição neste texto, deixo aqui o link para sua dissertação de onde adaptei uma nota acerca da sigla LGBT:

"Mentir pra si mesmo é sempre a pior mentira": a heteronormatividade na narrativa da trajetória…
Na escola, tende a operar uma norma social, na qual o padrão heterossexual de conduta seria o único a ter validade e…www.academia.edu