Slhueta de costas, mostrando longas pernas, calçando sapatos de salto, ao lado de uma placa onde se lê "Mar Doce Lar"

“Tantos anos desde que vi seu rosto e em meu coração há um espaço vazio”

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Sobre lembranças... luto... e amor, muito amor

 

E de repente, eu que tenho tanta facilidade com datas, percebi que se passaram 30 anos.

Esta música, lançada três anos depois, embala — em seus últimos versos — cada momento de lembrança que tenho de você, desde então…

Tantos anos desde que vi seu rosto
E em meu coração há um espaço vazio
Onde você costumava estar

Tanto tempo, foi há tanto tempo
Mas ainda entristeço por você

Com uma ou duas exceções, nunca falei sobre isso, e quando o fiz, foi quase sem detalhes. 
Ainda é difícil, mas não consigo mais manter isso dentro de mim…

Trinta anos atrás, eu estava no CEFET-RJ. Era o ano da terceira FETEC — Feira de Tecnologia — e novamente fiz parte da Comissão Organizadora.

Amizades, companheirismo, muito trabalho.

Conheci muita gente por conta da organização, inclusive uma jovem, dois anos a menos, inteligente, ligada no atletismo — que eu fazia em Educação Física, além de artes marciais (quem era essa pessoa tão ativa? Ainda sou pessoa que caminha, mas nada que se compare).

Entre estas atividades e conversas variadas, fomos nos aproximando. Ela se animou a ser voluntária da FETEC, e passamos a nos falar de segunda a sexta. Em tempos pré-internet e celulares, quando sequer telefone fixo era universal, era bastante conversa…

Foram poucos meses desta convivência mais próxima, embora eu já a conhecesse um pouco desde o ano anterior, quando foi nossa caloura…

Um dia, percebi que estava com aquela sensação de “borboletas” no estômago ao encontrar com ela. E podia jurar que ela, ao me procurar, também parecia um pouco “nervosa”, por vezes…

Mas entre aulas, atividades de política estudantil e organização da feira, nenhum passo foi tomado, por ninguém.

Até que, certo fim de tarde, encontrei a pequena saindo do treino, conversamos um pouco sobre a feira, ela tinha umas ideias que queria conversar no dia seguinte.

Eu a acompanhei até a portaria principal do CEFET. Ela pegava o trem, atravessando as pistas da Avenida Maracanã e subindo o acesso…

Nos despedimos. Dois beijinhos no rosto, como cariocas fazem.

Até onde sei, devo ter sido a última pessoa — amiga pelo menos — com quem ela falou.

E foi a última vez que eu a vi.

No dia seguinte, a direção geral (ainda não era reitoria), avisou sobre o acontecido e autorizou o ônibus da instituição a levar os alunos que quisessem a ir ao funeral, em Bangu, no dia seguinte, se não me engano.

Fui, mas não consegui olhar para ela. Não era ela ali, afinal.
Minha amiga era dinâmica, se não estava treinando, estava lendo, conversando, trocando ideias.

Acompanhei o funeral, me despedi, chorei no meu canto.

Nunca mais se passou um único dia em que eu não tivesse ao menos um pensamento para ela. Nunca deixei de chorar por falta dela.
Por muito tempo eram as únicas lágrimas que conseguia derramar.

Mas a data daquele dia em que ela, após se despedir de mim, atravessou com o sinal aberto para ela, e aquele ônibus, vindo por trás, não parou, não reduziu e a tomou, eu esqueci, se perdeu na memória…

Ainda me dói, cada dia um pouco menos.
Ainda há um vazio, tanto tempo depois.
Um espaço só dela, uma ode ao que poderia ter sido, ao potencial jamais realizado, jamais sabido.

Mas tenho certeza que, se houver um além, minha estrelinha está lá, brilhante como foi nos seus poucos 16 anos nesta terra.

Te amei, te amo e sempre vou te amar, pequena M

Sigamos.

Escrever sobre esse assunto, não foi uma escolha.

Foi um transbordar.

Só de escrever, a sensação ao final foi de alívio, e também uma certa medida de alegria em meio à melancolia do momento. Afinal, se sinto esta falta ainda após três décadas, é porque foi uma convivência alegre, positiva, não é mesmo?

E foi.

Este texto surge de uma compilação revisada de três postagens, de três dias seguidos, feitas em meu perfil no Facebook.
Foi um crescendo, uma catarse, talvez.
Um transbordar de sentimento, com certeza.

Em tempos de preconceito e discriminação, polarização política, ódio aberto e escancarado, falar de amor e receber o carinho que me veio nas reações e nos comentários, na postagem principal — inclusive de “amigos de amigos” — é algo a ser reconhecido, agradecido.

É de renovar esperanças…